Autonomia dos partidos é reforçada em projeto de novo Código Eleitoral

A autonomia partidária, já prevista na Constituição Federal, ganha novos contornos com a proposta do novo Código Eleitoral (PLP 112/2021), que está sendo analisada pelo Senado. O projeto consolida a atual Lei dos Partidos Políticos (de 1995) e reforça o poder das legendas para definir suas normas internas, funcionamento e estratégias.

Com a nova proposta, determinados temas passam a ser considerados como de competência exclusiva dos partidos, impedindo interferências externas. Entre esses temas estão a criação e alteração dos estatutos, regras sobre filiação e desfiliação, eleições internas, convenções partidárias, definição de coligações e estratégias eleitorais.

A proposta, de iniciativa da Câmara dos Deputados, estabelece que a autonomia dos partidos é um direito inalienável, vedando até mesmo a renúncia parcial ou total dessa autonomia em favor de entidades públicas ou privadas — com exceção dos casos de formação de coligações entre partidos.

Para o consultor legislativo do Senado, Ronaldo Jorge Araujo Vieira Junior, a independência dos partidos é essencial para o funcionamento da democracia e para assegurar a representatividade política. Ele ressalta, no entanto, que essa liberdade deve vir acompanhada de deveres: os partidos precisam observar as normas do processo eleitoral e agir com responsabilidade, evitando abusos de poder econômico ou político.

Outro consultor do Senado, Arlindo Fernandes de Oliveira, alerta para possíveis consequências negativas do fortalecimento da autonomia partidária. Segundo ele, essa medida pode dificultar a fiscalização estatal e limitar a atuação do Poder Judiciário, especialmente em casos que envolvam a democracia interna das legendas.

Mudanças previstas no novo Código

Entre as principais alterações propostas para os partidos políticos está o aumento do número de assinaturas exigidas para a criação de uma nova sigla. O projeto eleva esse número de 0,5% para 1,5% dos votos válidos na última eleição para a Câmara dos Deputados — o que corresponde a cerca de 1,5 milhão de assinaturas atualmente. Além disso, essas assinaturas devem estar distribuídas em pelo menos um terço dos estados, com no mínimo 1% do eleitorado que compareceu às urnas em cada um desses estados. Hoje, a exigência é de apenas 0,1%.

Outra novidade é a penalidade para partidos que abandonarem federações partidárias antes do prazo mínimo de quatro anos: eles perderão o direito às inserções de propaganda partidária no semestre seguinte. As federações foram instituídas pela reforma eleitoral de 2021 e funcionam como uma união temporária de partidos, atuando de forma conjunta nas eleições.

O projeto também propõe uma nova hipótese de justa causa para a troca de partido: a carta de anuência assinada pelo presidente do diretório regional. Atualmente, apenas o desvio reiterado dos princípios do partido e a discriminação pessoal são aceitas como justificativa, além da chamada “janela partidária”, período previamente definido em que as trocas são permitidas sem perda de mandato. Com a mudança, se houver carta autorizando a saída, não haverá punição — salvo se o estatuto da legenda trouxer regra diferente.

Outra mudança significativa é a transferência da competência para julgar conflitos internos dos partidos para a Justiça Eleitoral, mesmo nos casos em que esses impasses não afetam diretamente o processo eleitoral. Atualmente, esses conflitos são solucionados na Justiça comum.

O relator da proposta na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, senador Marcelo Castro (MDB-PI), sugeriu uma alteração no texto original que veio da Câmara: reduzir de oito para dois anos o prazo máximo de funcionamento dos diretórios provisórios dos partidos políticos.

Recursos públicos e critérios de distribuição

Os partidos também estão sendo contemplados com maiores volumes de recursos públicos. Em 2024, o Fundo Partidário — que é distribuído com base no desempenho nas eleições para a Câmara dos Deputados — chegou à cifra de R$ 1 bilhão, representando um aumento de 31,4% em relação a 2020. Deste montante, 95% são distribuídos proporcionalmente entre os partidos, e os 5% restantes são divididos igualmente.

Além disso, o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, conhecido como Fundo Eleitoral, criado em 2017, também registrou crescimento expressivo. O valor saltou de aproximadamente R$ 2 bilhões em 2020 para R$ 4,9 bilhões nas eleições de 2022 e 2024 — um aumento de quase 144%. Esse fundo é composto por recursos do orçamento da União em anos eleitorais e segue, majoritariamente, critérios de desempenho eleitoral para a distribuição.

A Comissão Executiva Nacional de cada partido é responsável por definir como os recursos desses fundos serão repassados aos candidatos. O novo Código também estabelece regras para garantir maior inclusão: pelo menos 30% dos recursos deverão ser direcionados às candidaturas femininas, além de haver distribuição proporcional para candidaturas de pessoas negras.

Os votos conquistados por mulheres e por candidatos negros também serão contados em dobro no cálculo de distribuição dos recursos do Fundo Eleitoral, incentivando uma maior diversidade na representação política. O texto exige ainda que os repasses para essas candidaturas sejam feitos até o dia 30 de agosto do ano eleitoral, assegurando tempo hábil para a realização das campanhas.

Por fim, o relator também incorporou uma emenda que restringe o bloqueio dos Fundos Partidário e Eleitoral apenas aos casos em que houver má gestão dos recursos, garantindo maior segurança jurídica às legendas.

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