Frente debate ações contra violência obstétrica
A violência obstétrica em suas diversas formas foi tema de reunião de frente parlamentar da Assembleia Legislativa (Ales) que aborda o assunto. O encontro ocorreu na tarde desta quarta-feira (25) no Auditório Rosa Maria Paranhos do Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes (Hucam) e reuniu profissionais da saúde, advogados que atuam na área de direito médico e estudantes.
Fotos da reunião da frente parlamentar
O presidente do colegiado, deputado Doutor Hércules (Patri), abriu os trabalhos destacando que luta há muitos anos por um parto mais adequado, humanizado, com o melhor atendimento possível para a mãe e os filhos. “Sou obstetra e fiz mais de 15 mil partos”, disse. Ele ainda contou que como acadêmico de medicina chegou a ver diversos casos de violência obstétrica, principalmente a verbal.
Marilia Fiorott, enfermeira obstetra e integrante da Associação Brasileira de Enfermeiros Obstetras (Abenfo) fez uma apresentação conceituando a expressão violência obstétrica. “É toda ação ou omissão direcionada à mulher durante o pré-natal, parto ou puerpério que cause dor, dano ou sofrimento desnecessário à mulher, praticada sem o seu consentimento explícito ou em desrespeito a sua autonomia”, explicou.
Dentre os exemplos de violência diagnosticados, citou a peregrinação da mulher por uma vaga em unidade hospitalar, abusos verbais, procedimentos sem consentimento dela ou informação adequada, negação de acompanhante da escolha da parturiente, ausência de privacidade e tratamento agressivo, discriminatório ou grosseiro.
Ela ainda elencou que o ato pode trazer algumas consequências traumáticas permanentes para a mulher nos sentidos físico e emocional, traumas (como depressão pós-parto e transtorno do estresse pós-traumático); conflitos com o companheiro; e propagação errônea do parto como algo ruim.
Dados
Para a outra palestrante, a epidemiologista Franciéle Marabotti, a falta de consenso na sociedade e até na literatura especializada a respeito da violência obstétrica prejudicam a obtenção de dados mais robustos e o desenvolvimento de caminhos mais efetivos de combatê-la.
Em sua explanação ela trouxe uma pesquisa realizada com 291 mulheres entre julho e novembro de 2018 em dois hospitais de ensino do Nordeste. Os dados apontaram que todas as mulheres entrevistadas sofreram algum tipo de violência. Marabotti acredita que tal panorama é pautado em duas grandes formas de violência: a de gênero e a institucional.
Apoio profissional
Conforme a presidente do Conselho Regional de Enfermagem (Coren-ES), Andressa Barcellos, a categoria é a maior da área da saúde e, por isso, é fundamental para a mudança de cenário de violência obstétrica. Porém, a enfermeira ressaltou que é necessário o empoderamento desses profissionais sobre o assunto, com a difusão do conhecimento para ressignificar a realidade de violência.
De acordo com a presidente da Associação de Doulas do Espírito Santo (Adoules), Aline de Almeida, a entidade tem em seu estatuto como objetivo a erradicação da violência obstétrica. “A doula é uma profissão nova. Foi a última a entrar na equipe multidisciplinar do parto. O compromisso da doula é estar ao lado da mulher, por isso a gente faz questão de ter essa autonomia”, afirmou.
Francesca Avanza, advogada especializada em direito médico e da saúde e integrante da Associação Brasileira de Advogados em Saúde (Abras), salientou que existe muita discussão no campo jurídico sobre violência obstétrica e que o Poder Judiciário na hora de avaliar qualquer caso precisa se basear em uma medicina escorada em evidências. Ela defendeu que, de forma geral, o parto deve ser seguro, adequado e humanizado.
Um ponto levantado pela advogada como primordial é que os profissionais da saúde precisam conhecer a legislação que abarca o campo de atuação deles. Mencionou, ainda, que o Brasil chegou a ser condenado por uma corte internacional por violência obstétrica contra uma mulher no Rio de Janeiro, e que está tramitando na Justiça Federal do Estado uma ação que investiga sucessivas mortes de gestantes na região Norte.
Protesto
Durante a reunião vários profissionais se manifestaram contra a fala do secretário da Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde (MS), Raphael Parente, que no lançamento da nova caderneta de gestantes, em maio deste ano, criticou o uso do termo violência obstétrica e defendeu procedimentos considerados antiquados, como a manobra de Kristeller (a aplicação de pressão na parte superior do útero com a finalidade de facilitar a saída do bebê).
Demandas
Outros assuntos debatidos foram a necessidade de revogação da Portaria 715/2022 do MS, que instituiu a Rede Materna e Infantil (Rami) no lugar da Rede Cegonha; a difusão de conhecimento a respeito do parto humanizado; a inserção do enfermeiro obstetra no cenário do parto; a criação de Casas de Parto no Estado, estabelecimentos especializados em partos naturais; e a construção de uma maternidade de alta complexidade no norte capixaba.
Além dos citados, participaram do evento o médico obstetra da rede estadual de saúde Ary Célio de Oliveira; a advogada sanitarista Clenir Avanza; representante da Superintendência do Ministério da Saúde (MS) no Espírito Santo Berivânia Lisboa; a subcoordenadora do curso de Enfermagem da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Márcia Valéria Almeida; e o diretor do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Ufes, Helder Mauad.
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