A dor que latia atrás do muro
O que mata um animal de estimação nem sempre é doença. Às vezes, é o abandono. Outras vezes, o descaso. E, em casos como o que ocorreu em São Geraldo, Cariacica, é a negligência disfarçada de rotina. Uma rotina que só termina quando alguém tem coragem de escutar o que os outros fingem não ouvir.
No dia 10 de julho, um Shih Tzu foi encontrado em estado de extrema fragilidade: cego, com hipotermia, coberto de fezes e larvas, sem forças para alcançar sequer uma vasilha de água — que, segundo o laudo oficial, estava podre. Ele tinha apenas oito anos. Estava longe de ser um cão velho. Tinha vida pela frente. O que faltou foi cuidado. Faltou amor. Faltou responsabilidade.
Mas houve reação. E ela veio rápido. Os vizinhos não foram omissos. Quando os vídeos começaram a circular nos grupos do bairro, o lamento abafado finalmente ganhou um endereço. As pessoas se mobilizaram. Foram até o imóvel. Chamaram os fiscais. Acionaram a polícia. Tentaram salvar. Tentaram intervir. A comunidade fez o que o tutor não fez: se importou.
E é aqui que entra um ponto que precisa ser exaltado: a atuação da CPI dos Maus-Tratos contra os Animais, presidida pela deputada Janete de Sá. Em um momento em que tantos fecham os olhos, a parlamentar abriu as portas da Assembleia para ouvir, apurar e encaminhar. E mais: anunciou com firmeza que vai pedir o indiciamento do tutor por maus-tratos, além de cobrar do Ministério Público o oferecimento de denúncia.
A condução da CPI tem sido exemplar. O tom é sério, o olhar é atento, e o compromisso é real. A deputada Janete de Sá tem feito o que se espera de um verdadeiro mandato popular: transformar dor em ação, sofrimento em política pública, denúncia em resposta institucional. Não se trata apenas de punir um caso isolado. Trata-se de criar precedentes para que nenhuma vida — humana ou animal — seja tratada com descaso.
O tutor do cachorro, aliás, sequer compareceu à CPI. Enviou atestado médico alegando gastrite. Enquanto isso, fotos, vídeos, relatos e o próprio cheiro do lugar onde aquele cão morreu continuam vivos, como prova — e como ferida.
O que aconteceu em São Geraldo não pode cair no esquecimento. Não é caso de “só um cachorro”. É caso de violência. E a violência, quando normalizada, só muda de alvo. Esse cão não morreu em paz. Morreu gritando — e só foi escutado quando já era tarde.
Que a justiça ouça agora. E que outras CPIs, outros mandatos, outros gestores sigam o exemplo firme e sensível da deputada Janete de Sá. Porque ainda há muitas dores latindo por aí, atrás de muros, atrás de portas, atrás da indiferença.
Foto: Lucas S. Costa
Deixe um comentário