A consciência da importância do patrimônio fotográfico no Espírito Santo ganhou um considerável progresso nas últimas décadas. Isso é perceptível pela presença de projetos de mostras, publicações e de conservação dirigidos ao universo da fotografia, o que tem provocado, de forma muito efetiva, na comunidade em geral e nos governantes, o interesse e a preocupação com o patrimônio fotográfico do Estado.
Notadamente, essa consciência se apresenta de forma mais ativa no que tange ao respeito ao valor do patrimônio fotográfico como documento e memória, fato que ocorre não somente nas instituições públicas e privadas detentoras de acervos fotográficos, mais também, de forma muito especial, no universo do âmbito familiar, percebido porque os indivíduos, pela imagem fotográfica e com as disponibilidades de interação que oferecem as redes sociais, têm demostrado, cada vez mais, interesse em conectar-se com sua história familiar, com o passado de sua cidade e com suas memórias pessoais e coletivas.
Nessa perspectiva, o patrimônio fotográfico tem desempenhado um papel muito interessante, pois está contribuindo para estabelecer vínculos entre os mais diferentes indivíduos que têm utilizado a imagem fotográfica como um instrumento ativador de processos de memória. De algum modo, isso parece que tem influído de forma sistemática na construção da identidade e valorização das culturas locais e estadual.
Portanto, um dos valores intrínsecos do patrimônio fotográfico é que ele possibilita ao indivíduo compreender o universo sociocultural e a trajetória histórico-temporal em que está inserido. As imagens fotográficas plasmadas sobre um suporte – papel, vidro, plástico – exibem formas de viver, conhecimento, valores e convenções sociais de uma época, o que faz da fotografia um testemunho do desenvolvimento estético, histórico e tecnológico de uma sociedade.
Por isso, ao fomentar o contato direto com um bem patrimonial como é a fotografia, conforme oportuniza o Edital n° 034 – de criação e produção de mostras de artes visuais para itinerância nos municípios capixabas – além de se contribuir para o fortalecimento de espaços de importância cultural nos municípios e oferecer atividades e lazer culturais gratuitos a população também promove a consciência coletiva da importância da conservação e da salvaguarda do patrimônio fotográfico local.
Assim, um dos objetivos deste projeto de mostra itinerante é contribuir para a reflexão sobre a importância e valorização do patrimônio fotográfico local. Suas ações pretendem provocar, nos diferentes públicos, a ideia de que conservar e difundir o patrimônio fotográfico é mais que contribuir para a perpetuação de imagens que documentam memórias e história local. É, sobretudo, um indício de amadurecimento cultural, um gesto de recuperação e reconstrução da memória, uma fonte que pode nos garantir, no Estado do Espírito
Santo, um futuro culturalmente consistente.
A fotografia nos acompanha há quase dois séculos e tem participado não somente dos registros dos grandes momentos de nossas vidas, mas também das formas de pensar e nos relacionarmos com o mundo moldando atitudes, comportamentos e senso estético.
No amplo universo de conteúdos que povoam a fotografia, desde a sua invenção e popularização no século XIX – industrialização, experimentos científicos, desenvolvimento das cidades, uso policial etc. – a família, sem dúvida, é um dos temas que mais estabeleceram uma relação de aproximação com a fotografia de forma patente. Por ser um agente consumidor importante, contribuiu para o progresso tecnológico da fotografia e o seu mercado de imagens. É notório que boa parte da história da fotografia mundial se sustentou, e hoje ainda se mantém, graças ao valor e importância dada à fotografia de família e seu papel fundamental de eternizar os grandes momentos dos grupos familiares, reforçando os seus laços e o sentimento de unidade.
Com esse olhar para a história da fotografia a mostra exibe uma seleção de imagens produzidas pelo fotógrafo Francisco Seibel, entre as décadas de 1930 e 1960. Os conteúdos dessas fotos suscitam diferentes contextos simbólicos, sociais e políticos e convidam a nos entranharmos nesse amplo universo, muito específico e original, que é a fotografia pomerana no Espírito Santo. O enfoque é trazer a reflexão do papel que têm os retratos de família, que associam o documental com o estético, para a história da fotografia local, nacional e para a memória e identidade do Estado do Espírito Santo.
Nessa perspectiva, buscamos considerar como os retratos de família contribuem para a história visual de uma comunidade, documentam situações, estilo de vida e gestos e se constituem uma iconografia que pode contribuir não só para o aprofundamento e compreensão do imaginário pomerano do Espírito Santo, mas, especialmente, também para a percepção de como a fotografia não enxerga fronteiras e nos aproxima, com seu amplo universo de conteúdos, da diversidade do nosso mundo e da riqueza das diferenças e semelhanças que habitam a profundidade do olhar.
Amostra é um pequeno recorte de um amplo universo de imagens fotográficas que são comuns em quase todos os lares pomeranos e se encontram guardadas em pequenas latas, caixas e baús, preservadas às vezes como relíquias preciosas ou simplesmente povoando e decorando as paredes das casas. São, antes de tudo, uma homenagem e uma recordação afetuosa dos filhos, amigos, pais e avós ausentes.
Essa relação dos pomeranos com a imagem fotográfica parece não ser tardia. Inicia-se com as imagens trazidas dos parentes que ficaram na terra de origem e com as fotografias realizadas dos primeiros imigrantes que por aqui chegaram, e se amplia, principalmente, com as imagens do início do século XX, as das primeiras gerações que nasceram emsolo capixaba. Essas fotos se tornamuminstrumento de lembrar que contribui para o exercício de recriarmentalmente o passado, relembrar as pessoas, os fatos, os momentos vividos que, mesmo não podendo ser trazidos totalmente de volta, refazem e recarregam os valores e costumes de uma época.
As preposições sobre esta mostra podem, em um primeiro momento, fazer parecer que o seu papel se detém somente no pensamento da fotografia como documento, no entanto há que se considerar que ela nos propõe sempre várias vias. Por esse ângulo, buscamos levar em conta que as fotos de família pomerana é um espaço privilegiado para que o público, de forma em geral, possa reconhecer a multiplicidade de usos e olhares da fotografia.
É importante considerar que as fotografias de famílias exibidas na mostra são, sobretudo, resultado de um olhar sobre uma realidade, um mundo, um grupo de objetos e pessoas que combinam o documental com o estético. Assim, tanto os interessados pela formação étnica do Estado e sua diversidade cultural, quanto aqueles que apreciam a estética fotográfica encontrarão nesta mostra diferentes conteúdos em relação a esses dois universos.
Os retratos de família de Francisco Seibel são imagens paradoxais, simples em sua realização, sem nenhuma idealização e, aomesmo tempo, trazemuma profunda carga expressiva e rica emconteúdos e implicações. Suas imagens, sem dúvida, celebram a heterogeneidade e as diferentes qualidades formais da prática fotográfica. É interessante chamar a atenção para a originalidade dessas fotografias de famílias que reside no fato de que elas exibem uma característica peculiar muito própria da história da fotografia do Espírito Santo: são registros de um universo rural de descendentes de imigrantes pomeranos.
Diferente do trabalho convencional realizado no estúdio fotográfico urbano, local para onde o cliente se dirigia para ser fotografado, no universo da fotografia rural pomerana, era o fotógrafo que se deslocava até as distantes propriedades com sua câmera para realizar a tomada fotográfica. Nessas propriedades, muito distinto do estúdio fotográfico urbano, que tinha como normativa a utilização cênica dos tradicionais telões pintados com mobiliários, objetos decorativos e também poses padronizadas, o espaço da fotografia de família pomerana tinha como cenário o ambiente doméstico rural, especialmente o externo, o quintal, com sua vegetação, plantas, árvores, arbustos, flores. Os diferentes objetos utilizados para compor a cena fotográfica eram provenientes das próprias casas dos fotografados.
As imagens de família pomerana representam, pela importância do seu conteúdo, a intensidade e a força cultural das tradições pomeranas registrando, sobretudo, parte de uma época, de um momento da história desse povo. São imagens de objetos e gestos que estão se extinguindo, por isso se tornam um instrumento para testemunhar o processo de transformação, das mudanças que ocorreram nas últimas décadas na cultura e na tradição desse povo.
A fotografia de família pomerana apresenta uma realidade rural própria da cultura capixaba e nos traz a originalidade de um valioso registro da história de uma comunidade que é uma expressão da diversidade cultural local,nacional e mundial que só enobrece o Estado do Espírito Santo.
Mostra itinerante contemplada pelo Edital de Seleção de projetos nº 034/2019 da Secretaria de Estado da Cultura.
Exibição
Domingos Martins – ES
Curadoria
Paulo de Barros
Abertura
14 de outubro de 2021, às 15h
Visitação
14 de outubro a 19 de novembro de 2021
Terça a sexta, das 8h às 12h e 13h às 17h
Sábados, domingos e feriados, das 10h às 16h
Ações educativas Agendamento de visitas, palestras e oficinas
Informações: (27) 3268-2550
casadacultura@domingosmartins.es.gov.br
Casa da Cultura de Domingos Martins
Avenida Presidente Vargas, 531, Sede, Domingos Martins – ES
Material gráfico
Aos visitantes serão disponibilizados catálogos e folders contendo textos e imagens que permitam conhecer e entender a importância da fotografia de familia pomerana para a cultura e a história da fotografia local.
Ações educativas
Paralelo a mostra serão realizadas ações educativas como as oficinas “Aproximação ao patrimônio fotográfico”; “A arte de olhar para criar” e “Brincando com a fotografia” Oficina/palestra “Aproximação ao patrimônio fotográfico” O objetivo da oficina é propiciar a compreensão do valor e do significado do patrimônio fotográfico para a cultura local e estadual e aproximar o público do conhecimento sobre a conservação de imagens fotográficas.
Oficina “A arte de olhar para criar”
Dirigida a um amplo público interessado em conhecer os conteúdos da linguagem fotográfica e se aprimorar na experiência visual pormeio da educação do olhar, a oficina pretende instruir os participantes a compreender as qualidadesparticulares da linguagem fotográfica, desenvolvendo sua sensibilidade inata e o olhar fotográfico pelo aperfeiçoamento das capacidades não só de criadores, mas também de receptores de mensagens visuais.
Oficina “Brincando com a fotografia”
É uma ação educativa que pretende oportunizar às crianças e adolescentes da comunidade vivenciar uma experiência estética, criativa e educativa com a imagem fotográfica, despertando o interesse pelo amplo universo dafotografia.
Paulo de Barros
Fotógrafo, professor e pesquisador da fotografia. Desde o ano de 1998, realiza pesquisas que resultaram em publicações como são os casos dos livros: “Memória Fotográfica da Serra: imagens de ummunicípio Brasileiro”; “Francisco Seibel e Emilio Schultz: dois fotógrafos num casamento pomerano”. No prelo as publicações “Eutychio d’Oliver: o Espírito Santo na Exposição Nacional de 1908” e “Cartões-postais do Espírito Santo: 1890-1930”, Realiza projetos de curadoria de mostras de fotografia, a exemplo das mostras “Foto Clube do Espírito Santo 55 anos” noMuseu deArte do Espírito Santo; “Francisco Seibel umfotógrafo rural do Espírito Santo”, Espaço Cultural Palácio Anchieta; mostra itinerante “Eutychio d’Oliver: um olhar sobre o Espírito Santo do início do século XX” contemplada pelo Edital de Seleção de projetos nº 016/2015 da Secretaria de Estado da Cultura e a mostra “Postais do Espírito Santo –acervo Monsenhor Jamil Abib”, exibida no Espaço Cultural Palácio Anchieta.
Desde 2004 têm se dedicado ao campo da conservação e preservação de fotografia antiga e contemporânea realizando, entre outros, a conservação do acervo de negativos de vidro do fotógrafo Francisco Seibel” – Edital de Seleção de projetos 009/2011; do Acervo de Fotografias da Coleção Mário Freire do Setor de Coleções Especiais da Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo” e a do acervo fotográfico do Museu do Colono de Santa Leopoldina.
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