STF inicia audiência pública sobre regras do Marco Civil da Internet
Os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, abriram na manhã desta terça-feira (28/3) a audiência pública convocada para debater a responsabilidade de provedores e de aplicativos de internet sobre conteúdos ilícitos ou ofensivos postados por seus usuários. Eles são relatores de dois recursos com repercussão geral que discutem regras referentes ao chamado Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014).
Também participaram da abertura os ministros Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso. Ao longo desta terça e da manhã de quarta-feira (29/3), o debate envolverá autoridades e especialistas de diversos setores nacionais e internacionais, governamentais e não governamentais.
Ao abrir a audiência, Toffoli afirmou que a lei estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil, mas não consegue contemplar todas as situações possíveis. Segundo ele, a evolução das tecnologias digitais “põe em xeque noções jurídicas tradicionais” para combater inúmeras violações a direitos fundamentais e da personalidade que ocorrem nas plataformas e redes sociais.
Decano do tribunal, o ministro Gilmar Mendes destacou a importância da discussão sobre a forma como a internet afeta a vida privada e a vida política das nações, lembrando os episódios de 8 de janeiro. Segundo ele, os ataques antidemocráticos “guardam conexão com o uso abusivo da internet” e que é urgente que se encontrem soluções para esse problema tanto na perspectiva judicial quanto na legislativa.
Na avaliação do ministro Luís Roberto Barroso, desinformação, discursos de ódio e assassinato de reputações e teorias de conspiração que circulam nas redes “se tornaram sérias ameaças à democracia e aos direitos fundamentais”. Segundo ele, é um desafio mundial lidar com essas questões sem afrontar a liberdade de expressão. Barroso defende, além de regulação e autorregulação no uso da internet, o investimento em educação midiática, para que as pessoas não repassem notícias falsas.
Já o ministro Alexandre de Moraes foi enfático ao afirmar que o modelo atual de gestão e uso da internet é ineficiente e falido, não só no Brasil, mas no mundo. Segundo Moraes, o atual modelo destrói reputações, dignidades, aumenta o número de depressão e suicídio de adolescentes e ainda permite a instrumentalização das redes para atos como os de 8 de janeiro. Segundo ele, provedores e redes não podem achar que só por serem depositárias de informações não têm responsabilidade nenhuma sobre os conteúdos, que “são terra de ninguém”.
O ministro da Justiça e da Segurança Pública, Flávio Dino, afirmou que o governo federal está trabalhando para contribuir com propostas para a regulamentação do setor. Segundo ele, é preciso “fixar fronteiras entre o uso e o abuso” na internet e que “liberdade de expressão sem responsabilidade é crime”. Dino também defende forma de regulação na programação de algoritmos.
O advogado-geral da União, Jorge Messias, defendeu a necessidade de se impor mais proatividade das plataformas nas inibições de ilícitos, uma vez que as empresas auferem lucros expressivos, a partir de modelo de negócios baseado na coleta de dados pessoais e comportamentais, monetização e impulsionamento de conteúdo. “Se essas empresas têm o bônus, e o Brasil é mercado muito lucrativo, também devem ter o ônus”.
O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Sílvio Almeida, disse que é preciso “colocar um freio” na disseminação do ódio e na produção sistemática de mentiras. Ele afirmou que esse é um compromisso que o Estado brasileiro precisa assumir.
Expositores da manhã
Ao longo da manhã desta terça, dez expositores se alternaram na audiência pública. O gerente jurídico do Facebook Brasil, Rodrigo Ruf, afastou a premissa de que haveria uma suposta inércia das plataformas na mediação dos conteúdos nas redes sociais e classificou como salutar o debate a respeito de uma regulamentação complementar sobre o tema.
O advogado do Google Brasil, Guilherme Sanchez, disse que a maior parte das remoções de conteúdo ilegal e nocivo não decorre de ordem judicial. Segundo ele, em 2022, mais de 1 milhão de vídeos foram retirados por violar políticas da plataforma. Sanchez acrescentou que aumentar a responsabilidade civil das plataformas não é a chave para uma internet mais segura e pode desestimular uma atitude mais responsável dos usuários.
O secretário de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação da Presidência da República, João Brant, disse que o modelo de responsabilidade definido no artigo 19 da Lei 12.965/2014 afeta direitos individuais, coletivos e a democracia brasileira. Brant apontou que, apesar de não ser possível saber exatamente o impacto de material nocivo divulgado nas redes, o modelo atual autoriza a omissão das plataformas digitais, que ficam desobrigadas de agir contra esses conteúdos, em ambiente no qual apenas elas podem atuar.
O secretário de Telecomunicações do Ministério das Comunicações, Maximiliano Martinhão, informou que a pasta está desenvolvendo um plano nacional de inclusão digital que visa garantir aos brasileiros os benefícios da transformação digital e busca ampliar a conectividade para a população.
Martinhão afirmou que a neutralidade de rede é um importante conceito do Marco Civil e acrescentou que as empresas que disponibilizam conteúdo precisam adotar medidas em relação ao que permitem publicar ou impulsionam, em linha com a lei quanto à responsabilização de agentes.
O procurador-geral Marcelo Eugênio Feitosa Almeida, da Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia da AGU, disse que é necessário evoluir do paradigma focado em ações mínimas do Estado em relação às plataformas para um novo modelo com enfoque em ações positivas das plataformas frente à cidadania, para garantir a liberdade de expressão e o princípio democrático.
Isis Menezes Taboas, assessora no Ministério das Mulheres, disse ser necessário garantir mecanismos de enfrentamento à violência contra as mulheres nas redes sociais. Segundo Isis, há nas plataformas digitais espaços organizados em que a “a misoginia reina” e que utilizam o discurso de ódio como uma prática da “pedagogia da desumanização do outro”. Com informações da assessoria de imprensa do STF.
RE 1.037.396
RE 1.057.258
Fonte/ https://www.conjur.com.br/2023-mar-28/stf-inicia-audiencia-publica-regras-marco-civil-internet
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